Quem quer ser gerente?

Em uma empresa comum, havia um programador comum.

O programador comum não era tão comum como todos pensavam, ele fazia muito bem o seu trabalho, o código que ele escrevia funcionava corretamente, os problemas eram poucos e os clientes, satisfeitos. Tanto sucesso começou a chamar a atenção dos superiores do programador. Ele começou a subir na empresa, recebendo mais e também podendo tomar decisões mais importantes, ele começava a sentir-se parte de tudo aquilo que o cercava.

Enfim, ele galgou o último degrau que um programador chegaria, havia se tornado ‘arquiteto’ dos sistemas que desenvolvia. Ele continuava fazendo muito bem o seu trabalho, e os seus superiores mais uma vez acharam por bem dar-lhe mais uma promoção, ele agora seria um gerente de projetos. Até então, ele não sabia o que o cargo significava, ninguém havia lhe dito o que ou como as coisas seriam feitas, mas ele aceitou de bom grado, afinal, era uma promoção.

Em poucas semanas, ele percebeu o problema que havia recebido de presente, não podia mais escrever código, seu trabalho agora era lidar com pessoas, interesses, prazos e custos. Ele havia passado anos na universidade, estudado por livros e cursos de extensão para aprender a programar, mas a única coisa que ele recebeu sobre gerenciar foi um pequeno livro, “os 10 ideais do gerente perfeito”, tão gasto que até a capa havia se perdido. Em pouco tempo, a infelicidade e os problemas já haviam extinguido suas forças, os projetos não mais andavam, os resultados eram pífios e seus superiores não paravam de pressionar.

Nesse momento, o simples programador perguntou a si mesmo, “quem disse que eu queria ser gerente?”.

Por mais que pareça um tanto quanto exagerada, a novelização da breve carreira de um programador até as posições de gestão normalmente segue esse caminho, especialmente no Brasil, onde praticamente não existem carreiras diferenciadas para quem faz e quem gerencia o que tem que ser feito. Em grandes empresas por todo mundo existem caminhos diferentes de crescimento, onde um funcinário pode optar por sair da carreira puramente técnica e passar para o lado da gestão de pessoas e projetos, ou ele pode simplesmente continuar evoluindo no caminho técnico e ter os mesmos vencimentos que teria um gerente na sua posição.

A carreira de gerência não é mais nem menos glamurosa do que a do técnico (ou engenheiro, como alguns preferem chamar) e chega a ser esquisito que se entenda que o gerente, especialmente em um lugar onde se faz trabalho intelectual, como desenvolvimento de software, seja visto como alguém que está acima hierarquicamente de toda a equipe. O Google tem engenheiros incríveis como “Crazy” Bob Lee e esses engenheiros valem tanto quanto os gerentes que fazem com que os engenheiros tenham condições de trabalhar. Ao contrário do que a lenda diz, o trabalho do bom gerente não é simplesmente ficar com o açoite na mão pra ter certeza de que todo mundo está trabalhando, mas garantir que todos tem condições de fazer o seu trabalho corretamente. Já pensou o que seria do Google sem os seus engenheiros geniais trabalhando em coisas como o GMail?

Mas os técnicos são tudo? Claro que não. Se não fosse um gerente com visão, o próprio GMail seria um projeto engavetado pelo pessoal do Google. Mas são trabalhos diferentes que existem pessoas e perfis diferentes. Um bom técnico não necessariamente vai dar um bom gerente e vice-versa. E ninguém nunca vai ser um bom gerente se nunca tiver sido treinado pra isso. Na maior parte das empresas, as pessoas simplesmente recebem a notícia de que agora vão “gereciar projetos”, em momento algum se fala em como se gerencia projetos, além daquela “repassada básica” do que precisa ser feito ou dos artefatos que precisam ser gerados e isso é um dos maiores motivos das falhas em posições de gerência, não ter conhecimento o suficiente para assumir o cargo.

Outro grande impedimento é que ninguém sabe tudo e ninguém precisa ser bom gerenciando, bons técnicos que não tem aptidão para gerência deveriam continuar como técnicos mas mesmo assim poder subir na carreira e ter posições equivalentes aos seus companheiros que tomaram o caminho da gerência, pois sem os ténicos, quem é que os gerentes vão gerenciar? Ambos os papéis são necessários, um não pode ser tomado em detrimento do outro. Precisamos entender que pessoas diferentes tem motivações e interesses diferentes, forçar alguém a assimir uma posição ou responsabilidades que não o interessam só torna o problema ainda maior para os dois lados.

Então, antes de simplesmente pegar o seu engenheiro predileto e colocar ele em uma posição de gestão, faça a pergunta mágica a ele, “você quer ser gerente?”.

Referências:

Peopleware: Productive Projects and Teams Behind Closed Doors: Secrets of Great Management